Presidente promulga diploma da Assembleia da República que permite acesso das secretas a metadados

OPINIÃO:
«A propósito da promulgação do Decreto n.º 147/XIII, que procede à segunda alteração à Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (Lei da Organização do Sistema Judiciário), cumpre-me suscitar as seguintes interjeições.
A Constituição Portuguesa apenas autoriza a ingerência no sigilo das comunicações em processo penal.
1. Se apenas relevasse o requisito subjetivo do controlo judicial, bastaria uma autorização prévia de um órgão jurisdicional. Contudo, se atentarmos na jurisprudência, não é bem assim. Mesmo em processo penal, o juiz de instrução só autoriza o acesso pelo MP a metadados de suspeitos determinados ou determináveis, perante a notícia de um crime.
Não obstante o exposto, de acordo com a nova versão da lei agora promulgada pelo Presidente, o acesso pode visar “a obtenção de informação sobre um alvo ou um intermediário determinado”; ou de “informação que seria muito difícil ou impossível de obter de outra forma ou em tempo útil para responder a situação de urgência.”.
2. Por outro lado, a recolha de informações para esse fim tem de se dirigir a um crime já praticado, num contexto previamente delimitado pelo objecto desse processo criminal, apenas se recolhendo informações sobre um específico facto.
3. Daí a conclusão no Acórdão proferido pelo TC em 2015, em fiscalização preventiva da constitucionalidade de um diploma que tinha precisamente o mesmo objetivo: permitir o acesso dos Serviços de Informações aos metadados.
Ou seja, passo a citar o Acórdão, “há uma distinção radical entre informações e investigação criminal, o que impede os oficiais de informações de intervirem no processo penal”.
4. Não obstante o esforço notório na nova versão do diploma de tentar superar, com sucesso, algumas das deficiências apontadas pelo TC, em 2015, para mim a dúvida teima: como legitimar perante a atual versão da Constituição o acesso dos Serviços de Informações a metadados, quando por natureza a atividade destes não é possível em processo penal? Ou permitir esse acesso em circunstâncias que mesmo em processo penal não são admissíveis?
5. Em suma, penso que o Presidente da República fez mal em não requerer a fiscalização preventiva da constitucionalidade do diploma. Um erro político, naturalmente. Nenhum “consenso jurídico” é suficiente para aclarar dúvidas que o Tribunal Constitucional agora só poderá resolver em sede de fiscalização sucessiva da constitucionalidade.»
Raquel Alexandra Brízida Castro,
Professora Auxiliar, FDUL
imagem retirada do site da Presidência, em: http://www.presidencia.pt
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